Moda Sensorial Inclusiva
- Heloisa Rocha

- 5 de out.
- 3 min de leitura
Pesquisa revela os principais incômodos que pessoas neurodivergentes e/ou com sensibilidade sensorial sentem ao se vestir.
Dados do Censo Demográfico de 2022, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontaram que 2,4 milhões de pessoas declararam ter recebido o diagnóstico do transtorno do espectro autista (TEA), o que corresponde a 1,2% da população brasileira.

A sensibilidade sensorial é uma das muitas características que o indivíduo autista pode apresentar, a exemplo da consultora de moda Beatriz Corrêa, de 33 anos, que é dona da marca Histórias do Grão. Sem entender a razão, ela sentiu, por anos, desconforto ao usar determinados tecidos - especialmente os sintéticos - e, por este motivo, decidiu que sua grife iria trabalhar com produtos 100% naturais. A explicação, no entanto, veio mais tarde com o diagnóstico de TDAH e, após um burnout, o de TEA.
Depois da descoberta, Beatriz Corrêa começou a se conectar com outras pessoas neuroatípicas, incluindo a modelo e agente cultural Raquel Abiahy. Assim como Beatriz, Raquel foi diagnosticada com transtorno do espectro autista tardiamente e, desde então, passou a se dedicar ao universo da moda inclusiva para pessoas neurodivergentes, tendo sido a primeira Miss Inclusiva com TEA e, também, a idealizadora do conceito "moda sensorial inclusiva" para a população adulta, pois, até então, o tema abarcava somente crianças autistas ou com sensibilidades sensoriais.
Durante essa conexão, ambas compartilharam suas "dores" no segmento da moda e, de acordo com Raquel Abiahy, um post em que ela comenta a necessidade de colocar fitas nas costuras internas das peças para poder vestir chocou Beatriz Corrêa. A partir desse relato, a dona da marca Histórias de Grão sentiu um misto de injustiça e revolta e, também, a necessidade de fazer algo a respeito, pois, segundo ela, grande parte da indústria não se preocupa com os consumidores neurodivergentes e/ou desconhece suas necessidades.
Diante de tais constatações, elas lançaram uma pesquisa online, na qual foram ouvidas 250 pessoas neurodivergentes e/ou com sensibilidades sensoriais para entender os principais desconfortos que sentem com as vestimentas.
Chamado de "mapa do vestir", o levantamento constatou que: 55% preferem tecidos naturais (linho, algodão), 25% optaram por tecnológicos leves (poliamida macia, elastano), 15% escolheram os mistos (algodão + elastano) e 5% citaram outros tipos. Vale destacar que, quando o assunto é tecido sintético, 65% relataram sentir calor, coceira ou incômodo, 20% apontaram ter tais sensações a depender do tipo do material e 15% disseram que não sentem diferença.
No quesito costuras, 40% apontaram as etiquetas como principal incômodo, 30% reclamaram das costuras grossas ou mal feitas, 20% citaram as linhas rígidas (nylon, overloque) e 10% não apresentaram nenhum desconforto. Quanto à sensação desejada nas roupas, 50% disseram que buscam leveza e frescor, 30% valorizam o toque macio, 15% querem liberdade de movimento e 5% priorizam durabilidade e estilo.

Com o resultado, Raquel Abiahy disse que os dados colhidos serão usados em seu trabalho de conclusão da pós-graduação em Moda, Arte e Cultura da Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF. Mas que, para além disso, pretende transformar o "mapa do vestir" em soluções práticas para que o movimento pela Moda Sensorial Inclusiva vire uma realidade para um número maior de pessoas, pois, segundo ela, é impossível ser porta-voz de todos os autistas e, até mesmo, pensar em soluções para todos os desafios que envolvem essa população, que é extremamente diversa, rica e singular. Dessa forma, ela decidiu provocar um novo olhar para um nicho específico, que é a indústria da moda, a representatividade e a criação de experiências sensoriais mais acolhedoras.
Enquanto o movimento da Moda Sensorial Inclusiva não é propagado, Beatriz Corrêa aconselha o mercado a ouvir mais o consumidor para entender (e atender) as suas necessidades, pois, segundo ela, a roupa deve servir e se adequar ao usuário e não o contrário. Já Raquel Abiahy lembra que há tecnologia, recursos e profissionais suficientes para promover a acessibilidade sensorial, porém falta força moral para que ela seja incorporada definitivamente à cultura de moda. E finaliza dizendo que já seria uma grande revolução se cada marca produzisse pelo menos uma peça com tecidos suaves e sem etiquetas e costuras internas.






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